13 abril 2024

Efeito Elon Musk

Quando a Folha de SP chega ao ponto de publicar um editorial e um artigo, em menos de 24 horas,  como os copiados abaixo, tem boi na linha. 👉 Como tem. Vem chumbo grosso e com consequências. Vai sobrar pro rabicho de muitos, respondeu-me imediatamente um leitor.

Os ratos já deixam o navio que rapidamente afunda. 

Boa leitura.

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Censura promovida por Moraes tem de acabar

Impedir alguém de se expressar nas redes sociais viola Constituição; puna-se o que for dito, após devido processo legal

13.abr.2024 às 22h00

Constituição, no nobilíssimo artigo dos direitos fundamentais, dispõe ser "livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença".

Como se o comando fosse insuficiente, a Carta o reforça no capítulo em que trata da comunicação social, ao vedar qualquer tipo de restrição à manifestação do pensamento, à criação, à expressão e à informação. O ordenamento, em suma, impede o Estado de calar um cidadão sob qualquer pretexto.

A ampla liberdade, no Brasil como no cânone democrático, caminha ao lado da responsabilidade individual. Uma pessoa pode dizer o que quiser sem ser amordaçada, mas estará sujeita a sanções penais caso o seu discurso configure crime, ou pecuniárias se conspurcar a imagem de alguém.

Quaisquer intervenções repressivas do poder público, portanto, deveriam sobrevir somente após algo ser expresso, nunca antes.

Pois um ministro do Supremo Tribunal Federal, com decisões solitárias em inquéritos anômalos —conduzidos pelo magistrado e não pelo Ministério Público, o órgão competente—, reinstituiu a censura prévia no Brasil. Ordens secretas de Alexandre de Moraes proíbem cidadãos de se expressarem em redes sociais.

O secretismo dessas decisões impede a sociedade de escrutinar a leitura muito particular do texto constitucional que as embasa. Nem sequer aos advogados dos banidos é facultado acesso aos éditos do Grande Censor. As contas se apagam sem o exercício do contraditório nem razão conhecida.

Urgências eleitorais poderiam eventualmente justificar medidas extremas como essas. O pleito de 2022 transcorreu sob o tacão de um movimento subversivo incentivado pelo presidente da República. Alguns de seus acólitos nas redes não pensariam duas vezes antes de exercitar o golpismo.

Mas a eleição acabou faz mais de 17 meses e seu resultado foi, como de hábito no Brasil, rigorosamente respeitado. O rufião que perdeu nas urnas está fora do governo e, como os vândalos que atacaram as sedes dos três Poderes em 8 de janeiro de 2023, vai responder pela sua irresponsabilidade.

Escapa qual seja o motivo para sustentar os silenciamentos, que violam um direito fundamental. Alexandre de Moraes tem, no mínimo, o dever de publicar todas as decisões que o levaram a exercer esse poder extraordinário.

Melhor mesmo seria que suspendesse as proibições. É um direito inalienável dos imbecis do bolsonarismo propagar as suas asneiras. Expostas à luz do sol, elas tendem a desidratar-se. Silenciadas, apenas alimentam o vitimismo hipócrita dessa franja de lunáticos.

Puna-se o que houver de crime no que for dito, mas sem recorrer ao instrumento inconstitucional e autoritário da censura prévia.

editoriais@grupofolha.com.br


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Moraes viola liberdade de expressão e devido processo legal

Glenn Greenwald

Jornalista, advogado constitucionalista e fundador do The Intercept

13/04/2024 13.abr.2024 às 7h00

Musk, além de falar a verdade, foi bastante comedido em críticas ao regime de censura comandado por ministro do STF


Elon Musk gerou intensa —e previsível— controvérsia ao criticar o regime de censura comandado por Alexandre de Moraes, ministro do STF. O foco da discussão foi qual deve ser o escopo ideal da liberdade de expressão e em quem se pode confiar para determinar que certas ideias não são permissíveis.

A adesão da esquerda à ideia de que Moraes é confiável para decidir o que é ou não permissível, verdade ou mentira, é bizarra.

Quando Moraes foi ministro da Justiça de Michel Temer (MDB), foi chamado de racista e corrupto por grande parte da esquerda brasileira. Sua indicação ao STF só escalou essa retórica: além de golpista, Moraes era fascista, racista, corrupto e mentiroso.


Em 2017, a conta oficial do PT publicou: "Na avaliação do petista [Wadih Damous], além de despreparado, Moraes é também 'fascista e mentiroso'". As acusações continuaram em 2018, quando Moraes, por exemplo, votou contra o habeas corpus preventivo pedido por Lula.

Moraes exerce seus amplos poderes sem nenhuma base legal. Os defensores da censura tentaram repetidamente aprovar o PL das Fake News. Tendo falhado no Congresso, preferiram que o STF entregasse o poder a Moraes. Como descreveu este jornal em editorial comemorando a não aprovação do PL, o texto era movido por "um ímpeto censório" e Moraes "tem cometido não poucos abusos ao retirar contas de usuários do ar.”

A falta de base legal para as ordens de Moraes não para aí. Quando, em 2022, o STF deu a ele o poder de unilateralmente exigir a remoção de postagens e o banimento de contas, a ministra Cármen Lúcia argumentou: "Não se pode permitir a volta da censura sob qualquer argumento". Ela só votou a favor desses poderes por achar que as eleições de 2022 eram uma "situação excepcionalíssima", mas enfatizou que esses poderes deveriam se esgotar em 31 de outubro de 2022, findo o pleito.

Moraes continua exercendo esses poderes mesmo passado o prazo. Desde então, ele repetidamente exigiu a remoção de postagens e o banimento de contas, inclusive de parlamentares democraticamente eleitos, alguns campeões de voto.

Como podem aqueles que defendem esse status quo —um juiz não eleito, agindo sem base legal, silenciando parlamentares— afirmarem que estão agindo em defesa da democracia? Assim como não se pode combater a corrupção com métodos corruptos —uma lição básica da Lava Jato— não se pode proteger a democracia com métodos autoritários.

Não há regime fascista que proteja a liberdade de expressão ou deixe de usar o poder da censura. O impulso por trás do apoio a Moraes é a mentalidade, também fascista, de que "os fins justificam os meios". Essa lógica de que as ameaças são sérias demais para que as liberdades normais sejam permitidas parece ter sido abraçada por setores da mídia e da esquerda com medo do bolsonarismo.

Ainda que o foco do debate tenha sido a liberdade de expressão, Moraes vem violando sistematicamente outro direito fundamental: o direito ao devido processo legal, previsto no artigo 5º da Constituição Federal. Esse direito proíbe qualquer punição judicial sem citação e conhecimento da acusação, arrolamento de testemunhas, elaboração de perguntas e igualdade entre acusação e defesa.

Em janeiro do ano passado, obtivemos e publicamos uma das ordens de censura sigilosas enviadas por Moraes. Ela obrigava seis redes sociais diferentes a banir imediatamente cerca de uma dúzia de brasileiros, entre eles parlamentares. É evidente que essa ordem viola frontalmente a Constituição: emitida em segredo, os usuários que tiveram contas banidas não receberam qualquer comunicação e nenhuma explicação foi dada sobre o que exatamente eles fizeram de errado.

O fato de os usuários não serem comunicados das acusações nem terem a oportunidade de contestá-las é uma forma clara e extrema de censura. Pior ainda, a ordem exigia que as redes sociais mantivessem tudo em segredo, não podendo nem comunicar aos usuários que tiveram suas contas bloqueadas, e que fosse cumprida em um prazo de duas horas sob pena de vultosas multas diárias.

Muitos acharam que Musk exagerou ao dizer que as ordens de censura enviadas por Moraes ao X eram desprovidas de explicações e determinavam que a empresa mantivesse tudo em segredo. Essa ordem, porém, mostra que ele não apenas falou a verdade como foi bastante comedido.

É compreensível que Moraes e seus apoiadores prefiram manter as ordens em sigilo. Sua leitura evidencia seu teor autoritário: não apenas contra a liberdade de expressão, mas contra o direito ao devido processo legal, garantido pela Constituição Federal. É grave.


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