26 janeiro 2021

ENTENDER O PRODUTO NUNCA FOI TÃO PRECIOSO

Durante a última semana circularam notícias sobre vazamentos digitais de grande envergadura, que expuseram informações de milhões de brasileiros, podendo ter atingido todas aquelas pessoas que possuam CPF.

Os dados vazados - algumas companhias os enxergam como ouro - estão sendo oferecidos - pra venda - em pacotes cujos preços variam de US$ 0,75 a US$ 1 por CPF, dependendo da quantidade comprada. O pagamento só pode ser feito em bitcoin.

"Para se ter ideia do valor de uma informação pessoal, é importante saber que grandes empresas já fazem a medição de seu "valuation" (termo em inglês que significa "Valoração de Empresas") pelos ativos de dados que têm. A Coca-Cola, por exemplo, uma das marcas mais valiosas do globo, tem informações de consumo do mundo inteiro que estão começando a fazer parte de seu valor global. No entanto, esses dados não são da companhia, mas sim do João, da Maria e de tantos outros consumidores do popular refrigerante e de outros famosos produtos." (Alexandre Resende)


Entender o produto nunca foi tão precioso. E por que a atribuição de tamanho valor a algo que pertence a terceiros? Porque dados pessoais (produto) são usados para gerar inteligência de negócio, além de poder proporcionar maiores fluxos de caixa futuros às companhias. Marcas que sabem com quem estão falando saem na frente.  


No documentário "
O dilema das redes", ex-funcionários das empresas mais rentáveis do planeta como Google, Facebook, Instagram e Twitter revelaram que as estratégias dessas companhias para vender anúncios, manipular os usuários é mantê-los cada vez mais conectados às redes sociais. 

Essa relação entre "fornecedores" e "usuários" pode ser resumida numa frase que tornou-se chavão entre as big techs e é citada no documentário: "Quem não está pagando pelo produto é o produto".


Não foi por acaso que, recentemente, o WhatsApp enviou aos usuários uma atualização de sua política de privacidade, e informou que passará a compartilhar os dados do seu público com o Facebook, base de dados esta que se somará aos ativos (informação) que ele já possui com os quais fatura muito alto.  Você, nós usuários das big techs somos apenas o seu produto.


Quem tem informação tem poder


Além de um faturamento gigantesco, as big techs demonstram diariamente o enorme poder que hoje possuem junto à sociedade e aos governos em todo o mundo, praticamente em todos os temas discutidos pela população: familiar, costumes, lazer, econômico, político, ... Delas nos tornamos reféns.


Contudo, onde há poder também deve haver segredo. Por isso essas empresas estão correndo atrás de opções técnicas que assegurem a segurança dos dados (nossos) armazenados em seus gigantescos sites/servidores, inclusive usando a criptografia quântica.


Numa imitação da Lei de Moore, Philip Zimmermann, que escreveu o programa de codificação Pretty Good Privacy (PGP), inventou a Lei de Zimmermann que afirma: 


"O fluxo natural de tecnologia tende a se deslocar na direção de tornar mais fácil a vigilância, e a capacidade dos computadores de nos rastrearem dobra a cada dezoito meses. Está na hora da criptografia sair das forças armadas, vir para o sol e abraçar a todos nós."

 e continua ... "A criptografia era uma ciência obscura, com pouca relevância na vida cotidiana. Historicamente, sempre teve papel especial nas comunicações militares e diplomáticas. Mas, na Era da Informação, a criptografia tem a ver com poder político e, em particular, com as relações de poder entre o governo e o povo. Tem a ver com o direito a privacidade, liberdade de expressão, liberdade de associação política, liberdade de imprensa, liberdade contra revistas e prisões injustificadas e liberdade de ser deixado em paz."


Regulamentação


Regulamentações vieram ao encontro da ampla discussão que tem sido realizada nos últimos anos após se tornarem públicos o caso Edward Snowden, acusado por vazar informações sigilosas de segurança do governo dos EUA e, mais recentemente, com o escândalo que envolveu a Cambridge Analytica e o Facebook por uso - sem consentimento - de dados de mais de 50 milhões de usuários para propaganda política. É uma necessidade também reconhecida para as novas relações que se estabeleceram em uma sociedade cada vez mais movida a dados (data-drive society).


No Brasil foi aprovada a  LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais), que está valendo desde setembro de 2020, e prevê sanções que vão desde uma advertência até uma multa de 2% sobre o faturamento anual das empresas, até o máximo de R$ 50 milhões. No entanto, as punições só devem ser aplicadas a partir de agosto de 2021. As empresas, órgãos públicos e privados, terão, até esta data, que adotar várias medidas para se adaptarem à LGPD.

5 comentários:

  1. A Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), responsável pela aplicação da LGPD, se pronunciou sobre esse vazamento de dados revelado pelo dfndr lab, laboratório especializado em segurança digital da startup PSafe.
    A ANPD disse que “está apurando tecnicamente informações sobre o caso e atuará de maneira cooperativa com os órgãos de investigação competentes e oficiará para apurar a origem, a forma em que se deu o possível vazamento, as medidas de contenção e de mitigação adotadas em um plano de contingência, as possíveis consequências e os danos causados pela violação”.
    O órgão afirma ainda que “sugerirá as medidas cabíveis, previstas na Lei Geral de Proteção de Dados, para promover, com os demais órgãos competentes, a responsabilização e a punição dos envolvidos”.

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  2. PROJETO DE LEI No 213/2021
    (Do Sr. LUIZ PHILIPPE DE ORLEANS E BRAGANÇA e outros)
    Altera o Marco Civil da Internet para possibilitar a indisponibilização de conteúdo por provedor de aplicações de internet somente devido a ordem judicial.
    O Congresso Nacional decreta:
    Art. 1o Esta Lei altera o Marco Civil da Internet, Lei no 12.965, de 23 de abril de 2014, para possibilitar a indisponibilização de conteúdo por provedor de aplicações de internet somente devido a ordem judicial.
    Art. 2o O Marco Civil da Internet, Lei no 12.965, de 23 de abril de 2014, passa a vigorar acrescido do seguinte art. 19-A:
    “Art. 19-A A indisponibilização de conteúdo pelos provedores de aplicação de internet ou a diminuição do alcance do conteúdo gerado pelos usuários somente poderão ser adotadas devido a ordem judicial.
    §1o Sem prejuízo das demais sanções cíveis, criminais ou administrativas, as infrações às normas previstas no caput ficam sujeitas, conforme o caso, às seguintes sanções, aplicadas de forma isolada ou cumulativa:
    I - advertência, com indicação de prazo para adoção de medidas corretivas;
    II - multa de até 10% (dez por cento) do faturamento do grupo econômico no Brasil no seu último exercício, excluídos os tributos, considerados a condição econômica do infrator e o princípio da proporcionalidade entre a gravidade da falta e a intensidade da sanção;
    III - suspensão temporária das atividades; ou
    *CD210690819500*
    Documento eletrônico assinado por Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PSL/SP), através do ponto SDR_56368, e (ver rol anexo), na forma do art. 102, § 1o, do RICD c/c o art. 2o, do Ato
    da Mesa n. 80 de 2016.
    IV - proibição de exercício das atividades.
    §2o Tratando-se de empresa estrangeira, responde solidariamente pelo pagamento da multa de que trata o §1o deste artigo sua filial, sucursal, escritório ou estabelecimento situado no País.”
    Art. 3o O Marco Civil da Internet, Lei no 12.965, de 23 de abril de 2014, passa a vigorar com a seguinte alteração:
    “Art. 20. Sempre que tiver informações de contato do usuário diretamente responsável pelo conteúdo a que se referem os arts. 19 e 19-A, caberá ao provedor de aplicações de internet comunicar-lhe os motivos e informações relativos à indisponibilização de conteúdo, com informações que permitam o contraditório e a ampla defesa em juízo, salvo expressa previsão legal ou expressa determinação judicial fundamentada em contrário.
    .....................................................................” (NR)
    Art. 4o Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
    continua ..

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  3. JUSTIFICAÇÃO
    As recentes suspensões das contas do Presidente dos Estados Unidos da América por plataformas como Twitter e Facebook revelam a extensão do poder exercido mundialmente por companhias detentoras de aplicações de internet. Tamanha concentração de poder é um risco para diversos direitos constitucionalmente instituídos, como a liberdade de expressão, a liberdade à informação e, em última instância, é também uma ameaça à democracia.
    A Constituição Federal de 1988 prevê com muita clareza a importância da liberdade de expressão e de manifestação de pensamento. O art. 5o da lei maior de nosso país, que trata de direitos e garantias fundamentais, estabeleceu, em seu inciso IX, que é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença. Além do referido inciso, há também os incisos IV e XIV, os quais versam sobre a liberdade de manifestação do pensamento e sobre a liberdade de informação. Esses dispositivos demonstram a incomplacência de nosso país com a censura.
    Desde 1988, no entanto, surgiram novas formas de comunicação e informação. A internet trouxe consigo uma facilidade de acesso a uma gigantesca quantidade de informação e foi necessário que surgissem novos atores. Conhecidos como provedores de aplicações, alguns se tornaram grandes e poderosos conglomerados econômicos, como Alphabet (Google), Facebook e Amazon. Dessa forma, a liberdade de expressão e de comunicação passou a ser exercida também no ambiente virtual, em especial por meio de provedores de aplicação. Atualmente é por meio dessas plataformas que se consegue debater, discutir e difundir ideias.
    A legislação brasileira acompanhou esse movimento, o que foi materializado pela aprovação, em 2014, do Marco Civil da Internet. Nessa Lei, permanece a preocupação com a liberdade de expressão descrita em diversas passagens, como nos arts. 2o, 3o, 8o e, de maneira bastante específica, no art. 19. Esse artigo permite responsabilização dos provedores de aplicação por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros somente se não forem tomadas providências após ordem judicial específica. Ou seja, o artigo protege os provedores de aplicação contra sanções caso o conteúdo de terceiros gere dano. Isso é bastante positivo, pois não gera nos provedores de aplicação um estímulo à censura prévia. Contudo, isso não basta. Os últimos acontecimentos, como a crise política norte-americana, quando houve censura do perfil de Donald Trump, demonstram que é preciso proteger o direito de manifestação e o direito à informação dos usuários contra a censura promovida pelos provedores de aplicação na internet.
    Ocorre que diversos provedores de aplicação criaram “termos de serviço” e “regras da comunidade”, as quais permitem a moderação de conteúdo. Nesse sentido, as detentoras dessas plataformas tornaram-se verdadeiras mediadoras da comunicação mundial, pois escolhem quem pode e quem não pode falar, decidem que ideias serão veiculadas e as que não podem ser. Ao deixar a cargo das empresas o que pode ou não ser difundido, as nações democráticas abrem caminho para que a censura seja uma prática diária e usual, contrariando dispositivos constitucionais.

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  4. As redes sociais são o exemplo mais claro do exercício desse tipo de poder. Tendo em vista a responsabilidade que possuem como mecanismo para exercício da liberdade de expressão, elas estão submetidas ao disposto no art. 220 da Constituição brasileira, cuja redação é: “Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.” Essa redação é bastante clara de que a remoção de conteúdo ou o banimento de contas com base na discricionariedade dos provedores é algo excessivo.
    O objetivo deste projeto de lei é exatamente coibir o abuso de poder cometido pelas plataformas de internet, como o Facebook e Twitter. No entanto, essas não são as únicas a extrapolar do poder. As plataformas de busca, como o Google, por exemplo, podem selecionar o que vemos e o que deixamos de ver na internet. Especialistas em comunicação já alertaram para o risco do uso de algoritmos, os quais permitem direcionar as buscas na internet, e conferem a essas empresas o poder de decidir aquilo que será encontrado e acessado na internet, moldando comportamentos de acordo com seus valores e interesses que podem ou não coincidir com os de cada um de nós.
    Essa possibilidade é reflexo do exercício de um duplo poder pelos provedores de aplicação: o poder de criar regras e o poder de executá- las. É um poderio sem precedentes no mundo democrático, ainda mais quando se considera que essas plataformas atingem bilhões de pessoas de diversas classes sociais e em praticamente todos os países. É algo incompatível com a pluralidade de ideias e com a diversidade, atributos esperados em ambientes democráticos.
    Sem a liberdade de se expressar, fica impossível contestar poderes instituídos que farão o possível para enfraquecer discursos contrários. A liberdade de expressão é causa e consequência da democracia, sem a qual há sempre um sentimento de patrulha indiscriminada, a qual seguramente se voltará contra o cidadão em algum momento.

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  5. É urgente, então, que o Marco Civil da Internet preencha essa lacuna legislativa, de modo a limitar as capacidades de intervenção de provedores de aplicação sobre o conteúdo de terceiros. Com isso evita-se que interesses corporativos possam se sobrepor a direitos previstos constitucionalmente, como a liberdade de manifestação e de informação. Ou seja, no exercício de sua liberdade de expressão, os cidadãos brasileiros devem obedecer às leis, não às regras criadas e implementadas por plataformas de internet e que impactam a vida de terceiros sem qualquer legitimidade.
    É ímpar preservar o papel das novas mídias digitais e é dever do Legislativo, por meio de leis, zelar para que as liberdades conquistadas com tanto sacrifício possam ser exercidas. E uma delas é a diversidade e a pluralidade de opiniões. Com este projeto, propomos que as plataformas possam somente remover conteúdos determinados por ordens judiciais. Fica assegurado também o direito de o usuário ser notificado sobre os motivos da indisponibilização do conteúdo e possa exercer o contraditório, razão pela qual foi necessário fazer um pequeno ajuste na redação do art. 20 do Marco Civil.
    A alteração ora proposta vale, portanto, para todos os provedores de aplicação abrangidos pelo Marco Civil da Internet, uma vez que não existe uma conceituação precisa que diferencie as diversas aplicações, como redes sociais, mecanismos de busca e lojas de aplicativos. Nesse sentido, caso a presente proposta fosse aprovada, evitar-se-ia, no Brasil, o recente caso em que o aplicativo Parler1 foi censurado.
    Para que essas determinações sejam efetivas, é necessário que estejam previstas sanções, as quais propomos que sejam as mesmas daquelas previstas para infrações relacionadas à proteção dos registros, dos dados pessoais e das comunicações privadas.
    Ressalta-se que as preocupações expressas no presente projeto de lei não são apenas de âmbito nacional. Essa é hoje uma preocupação mundial e alguns países já perceberam o risco da concentração de poder nos provedores de aplicação e em suas plataformas. A premiê alemã apontou como “problemático” o banimento de contas de Donald Trump e líderes alemães sentiram a necessidade de limitar o poder das companhias e de se assegurar a liberdade de expressão2. A Polônia, antes desses eventos, já havia anunciado um projeto de lei visando a liberdade de expressão online, permitindo que os usuários de internet possam mover reclamações contra remoções arbitrárias de postagens3.
    Por todo o exposto, rogamos ao apoio dos nobres pares ao presente projeto de lei.
    Sala das Sessões, em de de 2021.
    Deputado LUIZ PHILIPPE DE ORLEANS E BRAGANÇA
    Deputado FILIPE BARROS

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