14 maio 2023

Pelo Bem do Brasil: o conselho de um ex-ministro de Bolsonaro para um ministro de Lula


Adolfo Sachsida
Ex-ministro de Minas e Energia; e 
Ex-secretário de política econômica

Por três anos estive em cargos chave no Ministério da Economia, e depois assumi como Ministro de Minas e Energia. Falo com a experiência de quem já esteve na linha de frente da formulação e implementação de importantes políticas públicas no Brasil. Este artigo pode desagradar alguns, mas depois de muito refletir decidi escrevê-lo. Sigo aqui o conselho que o presidente Bolsonaro me deu quando me nomeou ministro: “Faça sempre o que for melhor para o povo brasileiro”.

Nos jornais de hoje o ministro Haddad diz “Estamos no caminho para deixar o país pronto para decolar”, apostando na aprovação da reforma tributária, do novo arcabouço fiscal e das reonerações tributárias para alavancar o crescimento econômico. Apesar de ser uma boa pauta econômica acredito que ela seja inexequível; e irá levar a um cenário de estagflação no segundo semestre desse ano gerando considerável pressão sobre a permanência da atual equipe econômica.

A reforma tributária só é consenso nos editoriais de jornais e no mundo acadêmico. Fora dessa bolha a realidade é bem diferente: a reforma tributária irá inevitavelmente aumentar a carga tributária de alguns setores (mesmo que seja neutra do ponto de vista de arrecadação). Além disso, a incerteza sobre o que será aprovado no Congresso e qual será a nova carga tributária de cada setor, o período de transição e a ausência de jurisprudência sobre o novo regime tributário irão paralisar o investimento privado no país. Melhor que uma reforma tributária ampla é reduzir a tributação toda vez que a arrecadação estrutural aumentar. Ou então atacar o contencioso tributário, as obrigações acessórias, melhorar a digitalização e os processos, e realizar melhorias marginais e consistentes no sistema. Melhorias marginais e consistentes tem efeito agregado importante, ainda mais se implicarem em redução de tributos (com a consequente redução do peso morto do tributo e aumento da eficiência econômica).

Se você não acredita em mim, então acredite ao menos em seus olhos. Em janeiro de 2022 o presidente Bolsonaro tentou reduzir o IPI. Atenção: reduzir o IPI pode ser feito por decreto (só depende do presidente da República, e não precisa de aprovação do Congresso). Reduzir o IPI beneficia imediatamente a quase totalidade da população brasileira, mas traz alguns empecilhos para a Zona Franca de Manaus. Pois bem, tivemos que reescrever 3 vezes o decreto (até excluir dele 95% dos produtos da Zona Franca de Manaus) até que o mesmo pudesse seguir em frente. Se com o IPI é assim você consegue imaginar o que irá acontecer quando você incluir nessa equação, além do IPI, o ICMS, o ISS, a COFINS, os regimes especiais, os estados e os municípios? Minha sugestão aqui é simples: esqueça esse tipo de reforma tributária. Você irá gastar um capital político enorme em algo que tem tudo para ser um novo Frankenstein e paralisar a atividade econômica do país gerando desemprego e queda na renda da sociedade.

A segunda agenda do Ministro Haddad é simplesmente tecnicamente errada: o novo arcabouço fiscal apresentado pelo governo é confuso, cheio de sub-regras, e uma garantia na expansão contínua do gasto público que só será sustentável com contínuos aumentos da já elevada carga tributária brasileira. Melhor é desistir disso e apresentar uma regra mais simples. Por exemplo, fixar um limite para a dívida pública e usar os superávits primários como instrumento para perseguição desse objetivo. Para tornar isso crível colocam-se gatilhos travando aumento de salários de funcionários públicos, contratações e outras travas orçamentárias a partir de determinado nível de endividamento. Essa regra é muito mais simples, transparente e exequível.

Em outras palavras, aprovar a regra fiscal proposta pelo governo terá pouco efeito sobre a credibilidade da política econômica ao mesmo tempo que implicará num desgaste junto a bases políticas. A visão otimista aqui, apesar de não compartilhar dela, é que o Congresso irá assumir o ônus político de uma regra fiscal mais dura. Em minha opinião, o governo irá lutar muito para manter uma regra que ao final terá pouco efeito sobre a credibilidade da política fiscal. Isto é, teremos uma nova regra fiscal que necessariamente aumenta a carga tributária, gera incertezas sobre a trajetória da dívida pública e diminui a eficiência econômica reduzindo o crescimento de longo prazo do país. Nesse ponto a evidência empírica é clara: ajustes fiscais via redução do gasto público apresentam resultados econômicos superiores a ajustes executados via aumento de tributos. Na situação atual do Brasil, a elevação de carga tributária irá reduzir o crescimento econômico, o que gera novos desafios sobre a ideia de um ajuste fiscal via aumento de tributos.

A terceira agenda do ministro Haddad é correta: reduzir os gastos tributários. Infelizmente aqui os exemplos do mundo real são desanimadores. Por exemplo, a desoneração de folha já consumiu mais de R$ 100 bilhões. Alguém realmente acredita que exista força política capaz de reverter essa desoneração? O maior gasto tributário é o SIMPLES, alguém acredita que o governo vai alterar o SIMPLES? Ou que irá tirar o benefício tributário de hospitais? Ou que irá reduzir as vantagens tributárias da Zona Franca de Manaus? Ou que irá alterar os regimes especiais?

Você já ouviu falar do REIQ (Regime Especial da Indústria Química)? Pois bem, em 2022 enviamos uma medida provisória ao Congresso acabando com o REIQ (como medida de compensação para poder reduzir outro tributo). Ao final da discussão no Congresso foi aprovada a extensão do REIQ. Em resumo, não só não conseguimos acabar com esse regime especial como o mesmo ainda foi prorrogado. A agenda de gastos tributários precisa ser debatida amplamente com a sociedade, e decisões importantes precisam ser tomadas nesse ponto. Contudo, no momento atual, acho difícil o governo conseguir aprovar reonerações importantes. Será um custo político alto para um resultado pouco expressivo.

Enfim, as três principais agendas do ministro Haddad, apesar de bem-intencionadas, levarão o Brasil a um quadro recessivo no segundo semestre. Se incluirmos aqui outras medidas econômicas equivocadas: elevação da meta de inflação, juros subsidiados pelo BNDES, aumento do crédito direcionado e fornecido por bancos públicos, fim das concessões e privatizações, fim da política de abertura econômica unilateral, fim da política de redução de tributos, aumento do gasto público, pouca ênfase na agenda microeconômica e na melhoria de marcos legais, ameaças de rever pontos da reforma trabalhista, muitos atores dando palpites sobre os rumos da política econômica, entre outros problemas, teremos um quadro de estagflação no segundo semestre: inflação e desemprego em alta; e PIB, produtividade e investimento privado em queda.

Dito tudo isso, aqui vai meu conselho a equipe econômica atual: foquem na agenda microeconômica. O Novo Marco de Garantias, o Novo Marco do Setor Elétrico, a venda de contratos da PPSA (que pode gerar R$ 300 bilhões ao governo) são todas medidas que já estão no Congresso e podem ser aprovadas com o apoio do governo. Além disso, a Secretaria de Política Econômica tinha em minha época várias iniciativas para aprimorar o mercado de capitais, de crédito e de seguros. Essas medidas podem ser ajustadas e enviadas ao Congresso. Enquanto fui Ministro de Minas e Energia igualmente me preocupei com a melhoria dos marcos legais. Existe um conjunto robusto de medidas no Ministério de Minas e Energia que podem ser enviadas ao Congresso para reduzir o custo da energia, melhorar os marcos legais de energia, petróleo, gás, e mineração, e impulsionar a entrada de capitais no Brasil gerando empregos e renda em nossa sociedade.

Em resumo, consolidação fiscal e reformas pró-mercado para aumento da produtividade são a chave para o crescimento econômico de longo prazo. Ter responsabilidade fiscal, reduzindo o gasto público como proporção do PIB e reduzindo a relação Dívida/PIB, e insistir na agenda microeconômica é o caminho trilhado pelo governo passado e que deveria ser mantido pelo atual governo. Essa agenda não dá manchete nos grandes jornais, mas gera emprego e renda para o povo brasileiro.

Termino esse artigo dizendo que o escrevi para honrar a promessa que fiz ao Presidente Jair Bolsonaro. Quando me nomeou ministro ele disse: “Faça sempre o que for melhor para o povo brasileiro”. E respondi: “Pode ter certeza presidente de que o povo brasileiro virá sempre em primeiro lugar”. A atual política econômica irá levar o Brasil a um desastre, e o povo brasileiro irá pagar essa conta via aumento da inflação e do desemprego. Já fui pobre, sei o que é o desemprego e a inflação. Sei o mal que a inflação e o desemprego causam nas famílias mais pobres. Esse artigo é minha modesta contribuição para ajudar nossa pátria, para ajudar nosso povo.

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