10 janeiro 2021

DITADURA COMUNISTA EM CUBA - DELA, VEJA O QUE DISSERAM ROBERTO AMPUERO E MARIO VARGAS LLOSA


Cuba já ultrapassou meio século da implantação de sua ditadura comunista em cuja - novíssima - constituição cubana (2019), o art. 5º define: "O Partido Comunista de Cuba - único, martiano (de José Martí), fidelista (de Fidel Castro), marxista (de Karl Marx), leninista (de Vladimir Lenin), vanguarda organizada da nação cubana, sustentado em seu caráter democrático e na permanente vinculação com o povo é a força política dirigente superior da sociedade e do Estado". - UMA PIADA.

Não há o que se comemorar, muita gente sabe disto. Mas para aqueles que quiserem conhecer o que lá ocorreu - e continua ocorrendo - sugiro a leitura do livro Nossos anos verde-oliva, um contundente testemunho sobre o desencanto que substituiu as esperanças transformadoras da Revolução Cubana nas juventudes latino-americanas.

Escrito por Roberto Ampuero, um jovem chileno que saiu de seu país, em 1974, fugindo da ditadura de Augusto Pinochet e buscando refúgio no comunismo da Alemanha Oriental. Lá apaixonou-se pela filha do embaixador de Cuba em Moscou e foi obrigado a se casar com ela e rumar para a "Ilha da Liberdade". A Ilha era a sua utopia e o Pinochet o seu pesadelo. Em pouco tempo, Havana lhe ensinou que ambos eram ditaduras, e que não há ditaduras boas nem justificáveis.

Nossos anos verde-oliva, é um romance autobiográfico sobre os anos em que Roberto Ampuero viveu exilado em Cuba, e para onde não pode mais voltar. Não se encontra mais disponível nas livrarias mas é fácil encontrá-lo à venda em sites na Internet. Dele transcrevo a seguir a carta de Mario Vargas Llosa dirigida ao seu autor em 25 de janeiro de 2010.

Querido Roberto:

Foi um prazer conhecê-lo, e só lamento que na correria de Santiago apenas tenhamos trocado umas poucas palavras, em vez da longa conversa que eu gostaria de haver tido. No entanto, a verdade é que estive dialogando com você todos esses dias, enquanto lia Nossos anos verde-oliva, que acabo de terminar. Escrevo estas linhas para lhe dar os parabéns por esse magnífico testemunho em forma de romance, que me comoveu profundamente. Fazia tempo que um livro não me absorvia e emocionava tanto como essa descrição tão honesta, tão veraz e tão lúcida de uma ilusão que compartilhamos tantos latino-americanos com a Revolução Cubana, e também o desencanto que se seguiu ao entusiasmo inicial ao ver que, ao contrário do que acreditávamos, a Revolução de Fidel e dos barbudos não era diferente das que converteram a Rússia e a China Popular nas satrapias que conhecemos. Seu livro descreve maravilhosamente todos esse mecanismo autoritário que pouco a pouco foi expropriando os arroubos libertários e justiceiros dos primeiros tempos e transformando Cuba em uma sociedade autoritária corrompida onde a mentira chegou a tornar inviável a vida para todo aquele que se negasse a aceitar a servidão e o engano. Ao mesmo tempo, o personagem central e narrador da história, apesar das muitas concessões que tem que fazer para sobreviver, nunca perde uma decência inata e um ideal de justiça que conseguem manter uma pequena luz de esperança em meio a essa deprimente realidade.

Nos anos imediatamente anteriores àqueles em que transcorre Nossos anos verde-oliva estive em Cuba cinco vezes e experimentei um processo menos traumático, sem dúvida, mas muito semelhante ao de seu personagem, e conheci e tive contato com muitos dos protagonistas de sua história. Principalmente Heberto Padilha, a quem conheci quando ele havia deixado a poesia para trabalhar pela Revolução, e, mais tarde, quando começaram seus atritos com o regime. É muito difícil escrever uma história como a que você contou sem cair no maniqueísmo nem no estereótipo, preservando a humanidade mesmo dos piores canalhas e, ao mesmo tempo, dando sempre todos os matizes e detalhes que permitem situar cada conduta e experiência dentro de um contexto geral. Ao mesmo tempo, o relato crepita de vida pela fauna pitoresca, patética, pícara e cínica que pulula em torno do narrador, e esses episódios de travessuras e bom humor que abundam as suas páginas aliviam a tensão que o leitor experimenta e lhe dão como que uns recreios de alegria. Você escreveu um esplêndido livro, que, asseguro-lhe, viverá por muitos anos e continuará ganhando leitores com o tempo.

Estou agora em Lima, revisando um romance no qual já venho trabalhando há uns três anos. Voltarei a Madri no início de abril e passarei lá, na Europa, o resto do ano. Espero que nossos caminhos se cruzem outra vez em algum lugar e que possamos ter por fim um longo papo literário, fofocográfico e político. Ando com muitas leituras obrigatórias agora, por causa de meu romance, mas tenho entre minhas próximas leituras por puro prazer o seu O caso Neruda.

Um abraço muito forte e parabéns mais uma vez.

Mario Vargas Llosa, 2010.

Nós brasileiros tivemos mais sorte. Em todos os momentos em que corremos riscos similares fomos salvos na undécima hora.



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