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15 janeiro 2021

O FECHAMENTO DA FORD PRECISA SER OLHADO COM LENTE GRANDE ANGULAR

Horas depois da Ford anunciar o fechamento de suas fábricas no Brasil, veio à baila a discussão sobre a existência, ou não, de uma Política Industrial (PI) no País, tema este discutido, acentuadamente, entre os profissionais que militam nas áreas de planejamento e/ou economia. Deveria também ser estudado por outros segmentos da sociedade.

Nesse contexto já ouvimos falar muito de nomes como os de Celso Furtado, João Paulo dos Reis Veloso, Antônio Barros de Castro, Carlos Lessa, Delfim Neto, ...  que estiveram à frente de pastas ministeriais e/ou do BNDES, ao longo dos últimos 60 anos.

De lá para cá muita coisa aconteceu, com destaque para a mudança de uma paisagem estática para uma dinâmica, que ganha mais velocidade a cada instante com o avanço das Tecnologias de Informação e Comunicação, as TICs.

No cenário mais recente, esse dinamismo está cada vez maior entre as empresas envolvidas com clientes e fornecedores em múltiplas redes de associação, cooperação e adaptação mútua. Qualquer decisão empresarial e/ou de política industrial tem que captar esse dinamismo econômico/empresarial. 

Aqui, o anúncio da Ford mostrou que o modelo de subsídios adotado pelos governos brasileiros compactuado com as montadoras ruiu. E a Ford é apenas um exemplo deste modelo. Com ele a empresa deixou de ser competitiva mesmo aqui no Brasil. Aquele famoso voo estampado na capa da revista "The Economist", durante os primeiros anos da política industrial lançada pelo PT tem cada vez mais se mostrado como um voo de galinha.

" O desenho da política industrial e a maneira com que o setor se desenvolveu nos últimos 15 anos foi absolutamente equivocado e estava fadado ao fracasso. Optou-se por tentar fazer no Brasil boa parte da cadeia produtiva — senão ela toda — sem ter escala para isso. Isso vale para a indústria automotiva, vale para a cadeia de petróleo, onde tentamos fazer todos os navios e plataformas aqui — de novo, sem ter escala." - Marcos Lisboa, Insper.

A Ford sabia disso e os governos também, com bastante antecedência. 

Do lado do atual governo, mesmo durante a sua campanha eleitoral, propostas para correção desse ambiente foram apontadas pelo "Posto Ipiranga". Passados mais de dois anos de sua administração, essas propostas continuam engavetadas na Câmara dos Deputados, por decisão de seu atual Presidente, Rodrigo Maia, que decidiu atuar politicamente em oposição ao País e ao governo que se iniciava. Estamos falando, pelo menos, da reforma tributária, da solidez fiscal, do fortalecimento das agências reguladoras e da abertura da economia.

Do lado da Ford, supomos que ela acreditava que o novo governo iria mais uma vez renovar os subsídios e, assim, continuar fabricando no Brasil. Ora, a sua matriz deve saber que indústria não é produção. Que esse processo foi desmembrado nos últimos tempos em concepção, inovação e fábrica de montagem. No Brasil a Embraer sabe muito bem disso. Lá fora o exemplo mais significativo vem da Apple. E todas sabem que as partes do processo que geram mais valor adicionado são as duas primeiras.

Não podemos falar para a Ford, mas para o Brasil, especialmente para o nosso Congresso Nacional esse episódio deve ser visto como uma grande lição.

E que essa lição possa ser rapidamente aprendida por empreendedores, políticos e Estado, (ah, hoje o judiciário também) para que se construa um ambiente sem subsídios, mas institucionalmente estável, com um sistema tributário claro e organizado, com agências reguladoras politicamente independentes, que estimule o empreendedorismo, a inovação e a geração de empregos.

Resumindo, o fechamento da Ford, se observado com lente grande angular, pode dar início a um processo e/ou modelo de desenvolvimento para um novo Brasil competitivo no cenário mundial.

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