O primeiro parágrafo do artigo escrito por J. R. Guzzo no jornal Gazeta do Povo, de ontem (11/05/2023), sintetiza bem o momento atual vivido pelo Brasil.
"Como pode haver democracia num país onde alguém é obrigado a dizer, e dizer em público, o contrário do que pensa? Não pode, é claro, e é por isso que existe no Brasil de hoje um regime de força, comandado pelo STF e operado pela polícia que está sob o seu comando."
Também José Paulo Cavalcanti Filho, em seu artigo de hoje (12/05/2023), publicado no Jornal do Commercio, segue na mesma direção ao afirmar:
"A democracia, segundo o ex-Primeiro Ministro da França Pierre Mendès France “é, antes de tudo, um estado de espírito”. E, se assim for, quem deveria mandar era o povo. Só que infelizmente, por aqui, esse Poder não somos nós, povo, mas o próprio Supremo", nos diz E continua, ...
Ao Supremo, já não basta ser o único Tribunal similar, no mundo, que não é só uma Côrte Constitucional. Nem também o único, no mundo, que admite decisões monocráticas. É pouco. Ele, agora, se acostumou a invadir a esfera de competência dos outros poderes da República. Em violação aberta à Constituição, (art. 2o, “São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”). E a própria competência, expressa e li- mitada, do próprio Supremo (art. 102, I “julgar”, II julgar”, e III “julgar”, somente.
Até quando os brasileiros irão suportar a atual ditadura? Nosso silêncio será quase que um ato de cumplicidade.
Abaixo a íntegra dos dois artigos. Boa leitura.
O STF está em guerra contra a Constituição e os direitos do povo
Desde quando é proibido criticar um projeto de lei que está em discussão pública no Congresso?
Como pode haver democracia num país onde alguém é obrigado a dizer, e dizer em público, o contrário do que pensa? Não pode, é claro, e é por isso que existe no Brasil de hoje um regime de força, comandado pelo STF e operado pela polícia que está sob o seu comando.
Existe, ainda, liberdade para certas coisas. Mas não existe para outras, como exercer o direito constitucional da livre expressão do pensamento – e liberdade não é algo que possa ser distribuído em fatias e a critério de quem manda. Quando é uma autoridade suprema, que concedeu a si própria poderes ilegais e acima de todos os outros, quem decide quais são e quais não são as liberdades permitidas para o cidadão há uma situação de tirania. O resto é pura enganação mal-intencionada.
O ataque conjunto do STF e das alas extremistas do governo Lula contra o aplicativo de mensagens Telegram é o escândalo mais recente nessa guerra aberta à Constituição e aos direitos dos cidadãos. O ministro Alexandre de Moraes, sem que nenhuma lei brasileira o autorizasse a fazer o que fez, obrigou o Telegram a retirar de circulação um texto de opinião, com críticas ao projeto de controle das redes sociais que o governo e o STF querem impor ao Brasil.
Qual é o problema? Desde quando é proibido criticar um projeto de lei que está em discussão pública no Congresso? E se não há, absolutamente, nenhuma restrição à publicação de opiniões a favor do mesmíssimo projeto, qual é a lógica legal para a proibição? Pior: o Telegram não só foi proibido pelo ministro de expressar a sua opinião, como foi obrigado a publicar uma opinião oposta ao que pensa, sob pena de suspensão e outras ameaças; teve de dizer o que o STF e o governo Lula querem que se diga sobre o assunto. Isso é coisa nazista, ou típica do antigo regime soviético.
O despacho do ministro no caso do Telegram não é um trabalho jurídico, ou uma decisão fundamentada na lei – é um manifesto político, com os seus pontos de vista pessoais e uma salada de incoerências, palavras de ordem da esquerda radical e frases destinadas a exibir força. Na ausência completa de razão, Moraes tenta provar que está certo com pontos de exclamação, letras maiúsculas e outros recursos gráficos; em vez de ficar mais convincente, consegue, apenas, tornar seu texto mais primitivo do que já é.
O governo Lula foi, naturalmente, na mesma direção. O ministro da Justiça, para se ter uma ideia do nível geral, disse que o Telegram quer provocar um “outro 8 de janeiro”. Nada disso disfarça o atentado à democracia que está na essência da decisão de Moraes – sua declaração de que cabe ao Poder Judiciário, acima de qualquer lei que possa ter sido aprovada pelo Congresso Nacional, decidir o que é certo e o que é errado para os 200 milhões de habitantes do Brasil. É a pretensão básica de todas as ditaduras.
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O poder supremo do Supremo
Ao Supremo, já não basta ser o único Tribunal similar, no mundo, que não é só uma Côrte Constitucional. Nem também o único, no mundo, que admite decisões monocráticas. É pouco. Ele, agora, se acostumou a invadir a esfera de competência dos outros poderes da República.
JOSÉ PAULO CAVALCANTI FILHO
jp@jpc.com.br
Lisboa. A democracia, segundo o exPrimeiro Ministroda França Pierre Mendès France “é, antes de tudo, um estado de espírito”. E, se assim for, quem deveria mandar era o povo. Só que infelizmente, por aqui, esse Poder não somos nós, povo, mas o próprio Supremo. Prometo passar um tempo sem falar dele, fique o lei- tor tranquilo. Mas não dá para calar, agora. Que este silêncio seria quase cumplicidade.
Ao Supremo, já não basta ser o único Tribunal similar, no mundo, que não é só uma Côrte Constitucional. Nem também o único, no mun- do, que admite decisões monocráticas. É pouco. Ele, agora, se acostumou a invadir a esfera de competência dos outros poderes da República. Em violação aberta à Constituição, (art. 2o, “São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”). E a própria competência, expressa e limitada, do próprio Supremo (art. 102, I “julgar”, II julgar”, e III “julgar”, somente.
A esfera do Poder Executivo, por exemplo, invade quase todos os dias. Desde proibir nomeações para cargos a vedar helicópteros voando sobre as favelas. A da semana passada foi dizer que um indulto, concedido pelo Presidente, não vale. Mesmo contra regra expressa da Constituição que lhe confere esse poder de “conceder indulto e comutar penas, com audiência, se necessário, dos órgãos institucionais em lei” (art. 84, XII). Sem nenhum condicionamento a qualquer exigência. Segundo o Estadão, é que os ministros “estão indo à desforra”. E se trata só de “vingança”, palavras do jornal. Assino em baixo.
Já no Poder Judiciário é todo dia. Como faz pouco, em decisão monocrática e fora de qualquer recurso, quando o ministro Toffoli (que não fazia parte do processo) mandou para casa um corrupto, Prefeito de cidade do Amapá, condenado em última instância com sen- tença transitada em julgado.
Agora, mais uma vez, é o Poder Legislativo. Está sendo votado, no Congresso, um projeto de lei das Fake News. O Ministro Alexandre de Moraes foi filmado levando papéis, segundo a imprensa um Projeto, ou alterações ao que estava em curso, para entregar ao relator Orlando Silva (PCdoB). A rigor não poderia, ética ou funcionalmente. Que, quase com certeza, vai julgar casos com base nessa lei. E deveria ser imparcial. Como a mulher de Cezar (Pompeia Sula), não lhe bastaria ser isento (objetivamente), mas aos olhos de todos parecer isento. E não é, sem dúvida possível.
Mas o que afinal fará agora?, eis a questão. Vai é legislar ele próprio, Supremo, tudo leva a crer. Já fez isso, antes, muitas vezes. Como, em 2019, para criar os crimes de “homofobia e transfobia”, que seriam equivalentes ao de “racismo”.
Fosse pouco vai fazer ain- da mais, a partir do próximo dia 19/05, quando (é o que se diz) vai proibir a demissão de empregados. Sem ouvir o Congresso. Se acharem injustas as atuais leis trabalhistas, senhores, saiam do Supremo e se candidatem. Para apresentar, acaso eleitos, um Projeto de Lei. Mas converter uma Côrte, feita para julgar, em órgão fazedor de leis, é um acinte.
Segundo a Folha SP, nesse caso das Fake News, o proje- to“criariscodecontroleesta- tal”. E O Globo sugere que o Supremovaiinvocarsuposta “omissão legislativa”. Só conheço um caso semelhante, no mundo, em que isso (quase) ocorreu. Quando na Itália se retardava na votação do Bozza Mammi (um projeto do ministro das Comunicações, Oscar Mammi). E a Côrte de Cassação notificou, o Congresso, de que não poderia mais ficar naquela posição de “self restraint” (usou, no ofício, essa expressão norte-americana). O que fez com que a nova Lei das Comunicações italiana fosse logo votada, pelo Congresso. Não sendo preciso criar nada pela Côrte. A pergunta é se, nesse caso das fakes, o Congresso será mesmo omisso. Haverá consenso, no mundo, e estaríamos sem legislar por aqui? Aos fatos, senhores.
Nos Estados Unidos, país reconhecidamente democrático, não existe uma única lei sobre o tema. Zero. E na Europa? Um país, Alemanha, tem lei sobre o tema, a Netzdg. Outros começaram a copiar. Mas a comunidade Europeia foi logo em frente e já se pronunciou. Quando o provedor não tenha “Capacidade Editorial”, ele é considerado só hospedeiro. Sem que se lhe possa imputar nenhuma responsabilidade. Fora disso, aplica-se a Lei de Imprensa. Tudo segundo o “Digital Services Act”. Sem nenhuma invenção que possa levar à censura.
Pessoalmente, creio que o tema deveria ser objeto de um tratado. Em que se buscasse a convergência de todos os países. Depois da Primeira Guerra, com a Convenção de Genebra, os países estabeleceram regras uniformes para notas pro- missórias (1930) e cheques (1931). Antes, no século XIX, acertaram regras para valer nas guerras. Por exemplo protegendo a Cruz Vermelha (depois, também o Crescen- te Vermelho), para garantir tratamento humanitário aos feridos.Poraí.Emalgummo- mento, vai ser mesmo neces- sário fazer uma Convenção similar, para o tema. Só que não há nenhum movimento em curso, ainda.
No caso, o Congresso tem o poder de decidir ainda não ser tempo de fazer uma lei como essa das fake news. É direito seu. Por não haver consensos mínimos, ou ante o risco de cair na censura. Tudo sugerindo que melhor seria discutir o tema com mais calma. E mais gente. Em vez de fazer tudo às pressas. E depois votar, ou não. Isso não é “omissão legislativa”, senhores. É só uma decisão, do Poder Legislativo, por não legislar.
Ocorre que o Supremo não ouve ninguém. E vai fazer sua própria lei. A do projeto Alexandre de Moraes, provavelmente. Ou outra, que venha pronta do Palácio de Planalto. Isso está certo? Será bom para o “estado de espírito” da Democracia? Nossa Côrte maior, que deveria zelar para que a Constituição fosse respeitada, emite sinais frequentes de que está assumindo o protagonismo de outro papel. Por fora dessa Constituição. Para além dela. Recordo comentário de Fernando Pessoa a seu amigo (e futuro biógrafo) João Gaspar Simões, em 11/12/1931, “Pasmo hoje, com vergonha inútil, de quanto admirei a democracia e nela cri”. Pois é.
PS. Lula nomear seu advogado Cristiano Zanin, para o Supremo, não é uma escolha. É um deboche.
José Paulo Cavalcanti Filho, advogado
Que Democracia é essa que eles (STF e atual Governo Federal) falam aos quatro cantos? Democracia que é jogada pelo ralo? Que Democracia é essa que as Leis brasileiras e principalmente a Constituição do Brasil são esquecidas?
ResponderExcluirEm defesa da Democracia. Que tenhamos a liberdade de opinião. Os ditames legais são são explícitos. Não ao anonimato. Calúnia, Difamação e Injúria são previstos legalmente. Opinião sobre um projeto público de lei... que eu saiba não tem proibição. Abaixo a Ditadura.
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