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27 setembro 2021

CHINA: FUROS, MEGALOMANIA E REVERSÃO

A crise da incorporadora Evergrande abriu um novo capítulo na reversão de rumo da economia chinesa e sacudiu o mercado de ações, desde que, nos anos 80, o país se abriu para o mundo e criou a sua versão de capitalismo de Estado. Neste momento ...

"A China Evergrande deixou investidores globais em dúvida sobre se irá realizar um importante pagamento de juros, ampliando os temores de que o governo chinês permitirá que detentores de títulos do exterior sofram grandes perdas, conforme se aprofundava, nesta sexta-feira, a crise de liquidez na empresa imobiliária mais endividada do mundo. 

A Evergrande, que deve 305 bilhões de dólares, ficou sem dinheiro e os investidores estão preocupados que um colapso possa apresentar riscos sistêmicos ao sistema financeiro da China e reverberar em todo o mundo. 

O prazo de quinta-feira para o pagamento de 83,5 milhões de dólares em juros de um título em dólar passou sem a Evergrande se pronunciar, e detentores de títulos não foram pagos nem ouviram nada da empresa, disseram à Reuters duas pessoas familizarizadas com a situação. 

A empresa tem um período de carência de 30 dias e dará calote se esse prazo passar sem pagamento. 

O silêncio da Evergrande agora contrasta com seu tratamento aos investidores domésticos. Nesta semana, a empresa resolveu o pagamento de cupom de um título doméstico.

"A visão de Pequim é que os detentores de títulos externos são amplamente instituições ocidentais e, portanto, podem receber tratamento diferente", disse Karl Clowry, sócio da Addleshaw Goddard. 

O banco central da China injetou de novo dinheiro no sistema bancário nesta sexta-feira, o que é considerado um sinal de suporte aos mercados. Mas as autoridades mantêm o silêncio sobre a situação da Evergrande e a mídia estatal da China não deu nenhum sinal sobre um eventual pacote de resgate." Por Anshuman Daga, Andrew Galbraith e Tom Westbrook, da Reuters, 24/09/2021.

Entretanto, a herança socialista, o grau de intervenção estatal continua existindo e é o responsável pela alocação ineficiente de capital, por bolhas especulativas, por “cidades fantasmas”, por províncias repletas de dívidas fora do balanço, por problemas gravíssimos que agora começam a cobrar seu preço.

Olhando-se para o que lá ocorria há dez anos e o que está acontecendo mais recentemente, nos revela um cenário bastante diferente. Chama a atenção o óbvio e contraditório contraste econômico ocorrido em menos de uma década. O contraste é, ao mesmo tempo, enigmático e assustador, e nos revela algo de importante sobre a natureza do recente milagre econômico chinês: ele é fundamentalmente falso e sem solidez. 

Nas grandes cidades, localizadas nas zonas de desenvolvimento econômico, o cenário é de enormes arranha-céus comerciais ao lado de grandes complexos de prédios residenciais de pelo menos 30 andares, agrupados em dúzias de edifícios enormes e idênticos. 

O que a noite revela

Porém, o cair da noite revela um cenário bastante diferente nestas mesmas cidades. Embora o pôr do sol faça com que as torres se destaquem ainda mais, é gritante a ausência daquele sinal mais básico da civilização: a iluminação artificial. A maioria destes edifícios já finalizados se transforma em meras silhuetas contra o pôr do sol. E, à noite, são tão escuros e completamente mortos. E não são edifícios recém-construídos, que apenas estariam esperando a mudança de novos moradores; são edifícios completamente desabitados e que nunca foram usados.

Mas os imóveis não representam toda a má alocação de recursos da economia chinesa. Com efeito, representam apenas uma fatia dela. Houve maciços e esbanjadores projetos de construção em toda a China, os quais envolveram a construção de basicamente qualquer coisa que você seja capaz de imaginar.

Durante um período de apenas dois anos, 2011 e 2012, o qual representou o ápice da tão aclamada "agressiva política de estímulos" do governo chinês em resposta à recessão do mundo desenvolvido, a China consumiu mais cimento do que os EUA consumiram durante todo o século XX

Furos e megalomania

O tão falado projeto do 'novo cinturão chinês', chamado de "Um cinturão, uma estrada" -- um projeto do governo chinês que busca, por meio de ferrovias, portos e rodovias, recriar caminhos milenares que conectavam o Ocidente e o Oriente -- nada mais é do que tudo isso em escala internacional. O objetivo do projeto é recriar a rota da seda com uma infraestrutura moderna, ligando o extremo oriente à Europa via terra e água. O projeto consiste em várias obras de infraestrutura em aproximadamente 60 países, e recorre a acordos comerciais para alavancá-lo. Na prática, trata-se de um grande projeto político. Ele é planejado pelo estado, financiado pelo estado e executado por empreiteiras ligadas ao estado. A intenção do projeto, ao menos durante sua fase de construção, é criar obras para empresas chinesas no exterior, garantindo empregos e receitas. Trata-se de algo baseado exclusivamente em planejamento central, e não em reais demandas de mercado.

Como bem resumiu o economista David Stockman, em 2017,

"a China é uma aberração cujo modelo econômico simplesmente não tem semelhança a nenhum outro modelo econômico já adotado por algum outro país em algum momento da história (nem mesmo ao modelo mercantilista de estímulo às exportações originalmente criado pelo Japão, e que já se comprovou insustentável). A economia chinesa é hoje uma mistura maluca de empreendedorismo de livre mercado em algumas áreas, de investimentos subsidiados e dirigidos pelo governo, de mercantilismo keynesiano, e de planejamento central comunista. Quando entrar em colapso, não será bonito."

Conclusão

O que a China nos ensina sobre economia e política econômica é aquela lição que quase nunca é fornecida nas salas de aula: é de crucial importância distinguir entre uma produção voltada para a criação de valor e uma produção que apenas consome e destrói capital.

A história do desenvolvimento econômico da China é, majoritariamente, uma história de crescimento insustentável e centralmente planejado, o qual mira apenas os números do PIB. Há uma visível falta de criação de valor, de acumulação de capital e de empreendedorismo voltado à satisfação das necessidades da população.

No Brasil, essa crise não mudou o tom bajulador da velha mídia e de outros personagens, já bastantes conhecidos e que exercem comando nos governos estaduais, a um regime opressor, ditatorial e centralizador, que não demonstra respeito algum por liberdades individuais, minorias, ou pelo clima, bandeiras que os "progressistas" costumam adorar. 

Curiosamente, é essa parte que parece atrair tanto os “intelectuais” e jornalistas brasileiros. Eles pensam que os modelos democráticos ocidentais se esgotaram, e que a solução pode estar numa liderança firme, centralizadora, por meio do estado. 



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