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25 junho 2023

Um presidente sem governo

A Revista Oeste trouxe neste fim de semana, em seu número 170 (terceiro ano de sua fundação), em sua matéria de capa, um conteúdo preciso sobre os primeiros seis meses de governo do ex-condenado Lula.

Não é difícil se supor que nem Lula acreditava em sua vitória eleitoral, até hoje discutida e desacreditada pela maioria dos brasileiros que nunca tiveram provas cabais de que os sufrágios contabilizados e à ele concedidos corresponderam fielmente ao voto que foi digitado pelo eleitor nas urnas eletrônicas tecnicamente ultrapassadas, há muito tempo.

Tal desacreditação do Lula justifica, em parte, o titulo da matéria produzida pelo jornalista Silvio Navarro e publicada pela Oeste e reproduzida a seguir. Dela destaco, para subsídio do comentário acima, o seguinte trecho:

[ . . . ] "Lula montou o Ministério sem planejamento. Não tinha um plano de governo na campanha. Não tinha nomes pré-selecionados para ocupar funções se fosse eleito. 

[ . . . ] Os cargos foram distribuídos em duas colunas: a da companheirada, tomada pelo PT e seu braço sindical, a Central Única dos Trabalhadores (CUT); e a ala mais ideológica e raivosa, que revelou ao país a existência de militantes do Partido Comunista do Brasil em pleno século 21."

 Boa leitura!

 

Em março deste ano, quando o governo dava os primeiros sinais de que havia pifado na largada, o presidente Lula participou de uma grande recepção para os prefeitos em Brasília. Àquela altura, o petista já precisava justificar a escolha de ministros sem nenhuma aptidão para o ofício e a reciclagem de projetos ultrapassados. Lula afirmou sem rodeios: “Prefiro um político competente do que um técnico. Porque o político entende um pouco de tudo, e muitas vezes o técnico não entende de nada”.

Foi um raro momento em seus discursos — sempre para plateias domesticadas — em que os aplausos não surgiram espontaneamente, e o semblante dos aliados sentados ao lado, como o de Rui Costa, chefe da Casa Civil, e Edvaldo Nogueira, prefeito de Aracaju e líder da Frente Nacional dos Prefeitos (FNP), dispensa legenda.

Por que a frase causou desconforto aos prefeitos, secretários municipais e alguns funcionários de carreira? Porque é um retrato fiel de um governo desengonçado e sem quadros qualificados para funções técnicas. O resultado tem efeito na ponta: desestimula a profissionalização das administrações municipais, deixando os prefeitos com dificuldades para conseguir recursos dos ministérios — porque não encontram os programas para encaixar suas demandas. Pior: ao bater à porta dos gabinetes de deputados da região, ouvem que eles também não têm diálogo com o governo.

Isso ocorre porque Lula montou o Ministério sem planejamento. Não tinha um plano de governo na campanha. Não tinha nomes pré-selecionados para ocupar funções se fosse eleito. O resultado foi o aparelhamento vertical de empresas, autarquias e bancos públicos. Os cargos foram distribuídos em duas colunas: a da companheirada, tomada pelo PT e seu braço sindical, a Central Única dos Trabalhadores (CUT); e a ala mais ideológica e raivosa, que revelou ao país a existência de militantes do Partido Comunista do Brasil em pleno século 21.

Esse segundo grupo é liderado pelo ministro Flávio Dino (Justiça e Segurança Pública). Ele abandonou a magistratura para seguir carreira como político comunista no Maranhão. Já afirmou, mais de uma vez, que manda nas Polícias Federal, Rodoviária, no combate ao crime organizado, na vigilância de fronteiras e demais frentes de inteligência. É a favor do desencarceramento em massa nas cadeias e quer a população desarmada. Quando o chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Gonçalves Dias, caiu por ser flagrado nas cenas do 8 de janeiro no Palácio do Planalto, foi Dino quem indicou um assessor para substituí-lo interinamente.

Lula tem uma espécie de dívida de gratidão com Dino. Ele foi um dos mentores do grupo de advogados conhecido como “Prerrogativas”, que atuou no Supremo para tirar o petista da prisão, reabilitá-lo juridicamente para disputar a eleição e demolir a Lava Jato nos tribunais. Hoje, Dino cuida da sintonia entre a Polícia Federal e o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que já prendeu 1,5 mil pessoas no país.

Gafanhotos

O grupo majoritário do governo Lula 3 foi montado em outra planilha. O PT e a CUT espalharam seus filiados por todos os lados onde havia as siglas CCE (Cargos Comissionados Executivos) e FCE (Funções Comissionadas Executivas). O Diário Oficial da União traz ao menos uma nomeação por dia. São a elite da administração pública, com salários que começam em R$ 20 mil e se perdem de vista com benefícios e gratificações. Há outros postos cobiçados — sem concurso público —, alguns temporários ou assentos em conselhos de administração. 

Nesta semana, a Presidência da República nomeou Gleide Andrade de Oliveira para o conselho da Itaipu Binacional. Ela é tesoureira do PT. O salário é de R$ 37 mil para participar de uma reunião a cada dois meses. Não é a primeira vez que isso acontece: João Vaccari Neto, que misturava as finanças do PT com o Petrolão — conhecido por cobrar o “pixuleco” —, ocupou o mesmo posto. 

A parte brasileira da empresa foi tomada pelo partido. O diretor-geral é o deputado paranaense Enio Verri, indicado por Gleisi Hoffmann. Os demais assentos do conselho ficaram para os ministros Fernando Haddad (Fazenda), Rui Costa (Casa Civil) e Esther Dweck (Gestão). A remuneração é considerada em Brasília um complemento para os salários dos ministros — de R$ 40 mil.

O avanço da nuvem de gafanhotos petistas aos contracheques da máquina pública foi retratado em abril, na edição 160 de Oeste. O primeiro alvo foi a Petrobras. O presidente, Jean Paul Prates, ex-suplente de senador do Rio Grande do Norte, nomeou até o ex-sócio de sua empresa privada do mesmo ramo, Sergio Caetano Leite, para a Diretoria Financeira da estatal. ​​Leite também foi secretário do Consórcio do Nordeste, epicentro do “Covidão”. A maioria dos demais cargos foi loteada pela Federação Única dos Petroleiros (FUP), filiada à CUT. Um dos sindicalistas, José Maria Rangel, o Zé Maria, vai controlar um orçamento de R$ 450 milhões para ações sociais da companhia — doação de cestas básicas e botijões de gás de cozinha, por exemplo.

Mas há casos que ganharam holofotes até da velha mídia pelo despudor. Por exemplo, a nomeação do ex-governador do Acre Jorge Viana para a Apex (agência de promoção do Brasil no exterior), com salário de R$ 65 mil, passagens aéreas e benefícios. O estatuto da empresa foi alterado, porque o petista não cumpria a exigência de ser fluente em inglês. Em vez de optar por um curso rápido do idioma, o governo mobilizou a Advocacia-Geral da União (AGU) nos tribunais para que ele não perdesse o emprego.

Derrotado nas urnas, Fernando Pimentel, ex-governador de Minas Gerais, ficou com a presidência da Empresa Gestora de Ativos S.A. (Emgea), vinculada ao Ministério da Fazenda. A Emgea cuida da gestão de ativos — bens e direitos — da União e de entidades da administração pública federal. O salário começa em R$ 42 mil.

Outros nomes passam despercebidos no rodapé do Diário Oficial. O ex-presidente da CUT Vagner Freitas, que prometeu pegar em armas contra o impeachment de Dilma Rousseff, comanda o Serviço Social da Indústria (Sesi). Gilberto Carvalho, que foi o responsável pela antessala de Lula e Dilma no passado, está empregado no Ministério do Trabalho, chefiado por Luiz Marinho. Carvalho é secretário nacional de Economia Popular e Solidária. O que isso significa? Provavelmente nem ele saiba, mas, de Brasília, tem a tarefa de “monitorar pequenas associações de agricultura familiar e cooperativas de coleta e reciclagem”.

O MST conseguiu o comando da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) com o gaúcho Edegar Pretto, além de trocar 19 superintendentes estaduais do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) da gestão passada. Os líderes do movimento também não precisam agendar audiências porque foi criado um ministério para atendê-los, a cargo de Paulo Teixeira (Desenvolvimento Agrário).

Ministério fantasma

A fragilidade técnica em detrimento dos conchavos políticos fica evidente numa simples busca pelas ações dos ministros nesses seis meses. O titular da Educação, Camilo Santana, só aparece nas manchetes da imprensa para lamentar os assassinatos brutais ocorridos em escolas ou anunciar a abertura de concursos públicos. 

Santana não sabe o que fazer até agora, por exemplo, com o Novo Ensino Médio — prorrogou a consulta pública por mais 30 dias. Pressionado pelos sindicatos de professores, o governo do PT barrou a proposta do ex-ministro Mendonça Filho, da gestão Michel Temer, que ampliava a carga horária e oferecia aulas profissionalizantes para o mercado de trabalho em vez de disciplinas empoeiradas. Camilo Santana obedeceu os sindicalistas e depois ficou paralisado porque não tem uma proposta.

Algumas pastas importantes, como Saúde e Cidades, têm parte dos seus orçamentos demarcados por programas antigos. Lula reciclou o Mais Médicos — usado no passado para enviar dinheiro a Cuba — e o Minha Casa Minha Vida. O público-alvo na habitação, desta vez, mudou: sai o pobre, entra a classe média. 

“O cara que ganha R$ 10 mil, R$ 12 mil, R$ 8 mil, esse cara também quer ter uma casa e esse cara quer ter uma casa melhor”, disse o petista nesta semana. A ideia é abrir linhas de crédito para imóveis de até R$ 500 mil. São faixas de financiamento muito acima do modelo desenhado para as camadas mais pobres.

Sem nenhum canteiro de obras para visitar, Lula tem falado em ressuscitar o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), marco da maior enganação em infraestrutura do país desde a redemocratização. Para ganhar eleições, a dupla Lula-Dilma prometeu desembolsar R$ 1,5 trilhão em cimento, mas executou só 18% das 30 mil obras. O dinheiro dos projetos foi drenado pela corrupção de políticos e empreiteiras descoberta pela Operação Lava Jato.

Outro exemplo de como Lula governa no retrovisor é o programa de incentivo ao carro popular, similar aos anos de Itamar Franco na virada da década de 1990. O petista não levou em conta que o chamado carro de entrada (faixa mais barata) não tem o mesmo apelo do passado e que os jovens, hoje, optam por transporte público ou aplicativos de mobilidade. Tampouco a medida foi bem recebida por montadoras de veículos, que sugeriram retirar os airbags e outros dispositivos de segurança para baratear os carros. É um episódio que também demonstra falta de interlocução com o empresariado. O vice-presidente, Geraldo Alckmin, seria o responsável por essa área, mas ele parece estar com a cabeça em outro lugar.

Ao menos dois ministros frequentam páginas de denúncias há meio ano. Por alguma razão ainda desconhecida, Lula não consegue se livrar deles. A ministra do Turismo, Daniela do Waguinho — referência ao nome do marido, prefeito de Belford Roxo (RJ) —, é acusada de ter laços com milicianos. O outro é Juscelino Filho (Comunicações), que usou verba pública para visitar uma feira de cavalos e construir estradas nas cercanias de sua fazenda e mandou chips de celulares para terras ianomâmis — onde não existem antenas de telefonia.

A promessa da área econômica é que o Produto Interno Bruto (PIB) vai dar uma guinada de crescimento por causa do “arcabouço fiscal”, algo que o ministro Fernando Haddad não conseguiu explicar o que é. Na prática, o Congresso vai autorizar o governo a gastar um pouco mais do que o teto atual, desde que os parlamentares fiquem com uma fatia do bolo. Quem vai produzir o texto, no final das contas, serão os parlamentares.

Personagens chamadas para o primeiro escalão pelo apelo midiático, Marina Silva, Simone Tebet e a indígena Sônia Guajajara, tiveram seus poderes limitados pelos ajustes do Congresso à medida provisória dos ministérios. Hoje, são figuras decorativas — e causam dor de cabeça porque reclamam disso publicamente. 

Na Cultura, além de cumprir a promessa de abrir o cofre para a classe artística que fez campanha, o único feito foi a inauguração de um letreiro na Esplanada.

No campo diplomático, o governo é desastroso. Lula nomeou o chanceler Mauro Vieira, mas segue as ordens do assessor para Assuntos Internacionais, Celso Amorim. É dali que surgem falas a favor da Rússia na guerra contra a Ucrânia, críticas ao dólar como moeda corrente internacional, afagos à China e desrespeito a Israel por causa da defesa da Palestina. O auxiliar defendeu a recepção ao ditador venezuelano Nicolás Maduro. Qualquer bate-papo com Celso Amorim é uma viagem no tempo.

A exemplo do que fazia Jair Bolsonaro, Lula resolveu fazer lives semanais sobre ações do governo. As transmissões são comandadas pelo jornalista Marcos Uchôa, ex-Globo, hoje na Empresa Brasil de Comunicação (EBC). As duas primeiras foram um fiasco de público — de 6 mil a 8 mil interessados. Na última delas, o presidente disse que faria um balanço dos seis meses na Cadeira, mas não levou nenhum dado e pediu paciência à população.

Gabinete da Janja

Na semana passada, a primeira-dama, Janja, se irritou com uma reportagem do jornal O Estado de S. Paulo. A publicação relatava o que se ouve em qualquer corredor do Congresso Nacional: Janja toma decisões de governo e interfere em várias áreas.

Além da personalidade da primeira-dama, o avanço em questões de governo ocorre porque faltam nomes de peso ao seu redor. Seu articulador político, Alexandre Padilha, não tem nenhum prestígio nem no Congresso nem no PT. Em 2014, ele foi responsável pela pior votação do partido numa eleição para o governo de São Paulo da história — teve 18% dos votos —, o que prejudicou a bancada de deputados na época. No ano passado, conseguiu um mandato de deputado com 140 mil votos. Os próprios assessores da sigla na Câmara afirmam que seu nome sequer era cotado para liderar a bancada. Uma das credenciais para a coordenação política é conhecer os caminhos do Congresso — não à toa, desempenharam a tarefa nomes como José Dirceu, Romero Jucá, Aldo Rebelo e José Múcio Monteiro. Mas quem poderia desempenhar a tarefa no lugar de Padilha? Lula não tem um substituto.

No mês passado, o presidente preparou uma saída honrosa: Padilha seguiria no comando do “Conselhão” — grupo com 250 integrantes que se reúne sem pauta definida e não conclui nada. Desde o seu primeiro organizador, o petista Tarso Genro, Lula usa o Conselhão para acomodar algum aliado que despreza. Por que Padilha não caiu naquela semana, marcada por derrotas na Câmara? Porque Janja gosta dele. Foi ela quem o incentivou a usar a aberração “todes” na abertura dos discursos e cerimoniais. Padilha costuma sair em defesa da primeira-dama nas redes sociais dizendo que ela é vítima de misoginia e machismo. 

Uma nota do colunista Lauro Jardim, no jornal O Globo, por exemplo, citava a dificuldade de ministros e parlamentares em almoçar com Lula sem a presença de Janja à mesa. Padilha reagiu nas redes sociais: “Muito bem, Janja! Aviso a todas e todos, almoçar com quem se ama e defender uma alimentação saudável faz muito bem para a saúde! Precisamos do PR Lula sempre saudável e feliz. Faz bem para vocês, para o governo e para todo o Brasil”.

Quando precisa conversar com sua base — restrita a 130 cadeiras, a menor em um governo petista desde 2002 —, Lula esbarra no perfil beligerante dos quadros. Os principais líderes, Gleisi, Lindbergh Farias (RJ), o senador Randolfe Rodrigues (AP) e o petista Zeca Dirceu (PR), causam mais incêndios do que acordos. A presença de Renan Calheiros (MDB-AL) atrapalha qualquer diálogo com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), seu inimigo pessoal. E o restante da tropa gasta mais tempo no Twitter do que em plenário.

Sem uma equipe que o ajude a sair do atoleiro, sem votos no Congresso, vaiado nas ruas e sem público na internet, Lula tem optado pelo aeroporto. Nesta semana, o presidente que já chegou ao poder como o que mais viajou na história — 146 viagens, com escalas em países diferentes —, foi a Roma e ao Vaticano. Janja ainda não tinha uma foto com o papa.

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