No início do ano (2024) estavam previstas eleições em aproximadamente 40 países, envolvendo mais de 40% da população mundial, cujos impactos dos resultados das urnas já estão sendo sentidos em níveis globais.
Os resultados servem para nos lembrar que democracia vai além das eleições e não é a única medida de sua saúde, pois não faltaram exemplos de regimes autoritários que usam as urnas como uma fachada para legitimar o que de fato são ditaduras.
A Rússia é de longe o mais bem acabado dos exemplos. Sob o comando de Vladimir Putin, as eleições tornaram-se meras formalidades para a manutenção de seu poder. Não há concorrência de fato ou nem sequer liberdade de expressão. O jogo é jogado segundo as regras do dono da bola. Além do simulacro eleitoral de Putin, em 2024 o mundo assistiu a processos similares na Venezuela, Belarus e no Irã, para citar apenas os casos mais esdrúxulos.
Os países que foram às urnas em 2024 têm ampla variedade de áreas geográficas, de economia e de influência. Vão desde as ditaduras já citadas, passando por pontos nevrálgicos no cenário geopolítico mundial como Taiwan, Índia e Paquistão; caóticos como o Sudão do Sul e chegando aos estáveis Áustria, Bélgica e Reino Unido. A eleição presidencial dos Estados Unidos foi aquela que chamou mais a atenção. Mas ela não deve ser observada sem o conjunto em disputa e as ameaças à crença na democracia e nos sistemas eleitorais.
Ao mesmo tempo em que Rússia, Irã, Venezuela e seus aliados, Cuba e Nicarágua, usam suas eleições fajutas como escudo, eles trabalham para minar a confiança na democracia. Em 2016, a Rússia fez isso com maestria nos Estados Unidos, quando fez a imprensa e o establishment político acreditarem que houve uma interferência suficientemente capaz de intervir no resultado da eleição que levou Donald Trump ao poder.
Em 2020, quando Trump perdeu para Biden, Moscou fez o mesmo. Mas desta vez para valer. Teleguiou a base tresloucada do republicano pelas teorias do QAnon e plantou a semente da descrença nas instituições democráticas e no Ocidente. A baderna que resultou na invasão do Capitólio em janeiro de 2021 foi o resultado mais visível desse esforço das autocracias para minar as democracias. Um levantamento da organização Freedom House mostrou que 2023 foi o 17.º ano consecutivo em que a liberdade global regrediu. Em 2024 não foi diferente tendo o Brasil alcançado o ápice mundial.
Parte disso se deve aos ataques sistemáticos à liberdade de expressão – que é um direito essencial para o pleno funcionamento da democracia e que antecede as eleições, direito a votar e ser votado. Restrições à liberdade de imprensa, regulamentações on-line e medidas contra o discurso de ódio estão ultrapassando os limites do remédio e estão se tornando veneno.
Em 2024, guerras e conflitos afetaram algumas transições. Os ucranianos deveriam ter realizado eleições no primeiro trimestre, já que o mandato de cinco anos de Volodymyr Zelensky terminou em maio.
Os impactos geopolíticos e econômicos das eleições servirão de parâmetro para entender a reorganização do mundo com a redistribuição de poderes entre China e Estados Unidos. O retorno de Donald Trump à Casa Branca já impôs um teste para a eficácia dos esforços de Xi Jinping na captura de aliados pelo mundo, frente à capacidade dos Estados Unidos nos seus esforços de esvaziar a influência chinesa.
Oriente Médio
A queda do líder sírio Bashar al-Assad no domingo (08/12/2024) chocou o mundo. Depois de mais de uma década de uma guerra civil extenuante, muitos presumiram que o regime de Assad manteria seu controle sobre o país, por mais violenta ou tênue que fosse, e que a causa da oposição estava efetivamente encerrada. Agora, com Damasco sob o controle de Hayat Tahrir al-Sham — um grupo rebelde anteriormente ligado à Al Qaeda e ainda designado como uma organização terrorista pelos Estados Unidos — o destino da região, ainda envolvida em conflitos em Gaza, Líbano e outros lugares, parece mais incerto do que em qualquer momento desde a Primavera Árabe de 2010-11.
Mas os efeitos das revoltas nunca devem ser medidos em regimes derrubados ou eleições democráticas realizadas. Em um nível mais profundo, esses movimentos reformularam profundamente todas as dimensões concebíveis da política árabe, incluindo atitudes individuais, sistemas políticos, ideologias e relações internacionais. E como os principais impulsionadores da instabilidade — os próprios regimes autoritários — permaneceram no lugar, mais agitação fervilhava sob a superfície. Afinal, foram a corrupção, autocracia, governança fracassada, rejeição da democracia e abuso de direitos humanos desses regimes que levaram as pessoas à revolta.
No entanto, para qualquer país que possa pensar que pode aproveitar o potencial revolucionário da região, é bom ter sempre em mente que o Oriente Médio está muito além da capacidade de qualquer potência externa de a controlar.
EXCELENTES REFLEXÕES E INFORMAÇÕES HISTÓRICAS DE GRANDE RELEVÂNCIA.
ResponderExcluir