Leonardo Coutinho, em seu livro "Hugo Chávez - o espectro", nos traz, de forma eloquente e estruturada, fatos que aconteceram na Venezuela, nas últimas décadas. Entre eles está o círculo de amizade dos presidentes Hugo Chávez e Nicolás Maduro com Lula. Abaixo cópia, na íntegra, das páginas 74 a 76, (livro capa dura) sobre o ocorrido no ano de 2011. Em posts anteriores o leitor poderá encontrar resumos de outras partes do livro já publicadas neste Blog. Estão acessíveis após cliques nos seguintes títulos: Lula e Dilma sob as ordens de Chávez e Narcobolivarianismo visitou o Brasil.
Boa leitura.
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O então embaixador da Venezuela no Brasil, Maximilien Arvelaiz, e Lula no funeral de Hugo Chávez, 2013. Foto de Ricardo Stuckert/Instituto Lula |
Em fevereiro de 2011, um ano e nove meses antes das eleições que viriam a reeleger Hugo Chávez para seu terceiro mandato, o ex-presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, convocou o então embaixador da Venezuela no Brasil, Maximilien Arveláiz, para traçar uma estratégia com vistas a resolver um problema que vinha tirando-lhe o sono.
– Eu durmo tranquilo porque sei que Chávez está ali [na presidência], mas também, às vezes, perco o sono pensando que Chávez poderia perder as eleições de dezembro de 2012.
O relato da conversa está em um telegrama diplomático enviado por Arveláiz a seu chefe, o então chanceler Nicolás Maduro. O documento descreve um encontro reservado no qual Lula, que havia deixado a presidência menos de dois meses antes, traçou sua estratégia para ajudar Chávez a vencer as eleições. Naquele momento, o brasileiro esbanjava confiança. Ainda tinha o gosto da vitória pessoal que fora eleger Dilma Rousseff como sua sucessora, para o terceiro mandato consecutivo do Partido dos Trabalhadores e, de certa forma do próprio Lula, pois ele se considerava o único responsável por construir – contra todos os prognósticos e o próprio partido – a candidatura vitoriosa de Dilma.
Arveláiz relata que, para Lula, “uma derrota de Chávez em 2012 seria igual ou pior que a queda do Muro de Berlim”. O ex-presidente sugeriu a criação de um comando de campanha sediado no Brasil que ele coordenaria pessoalmente, ao lado de José Dirceu. Como peça central de sua estratégia, Lula enviaria para Caracas o publicitário João Santana, que havia comandado sua campanha à reeleição em 2006 e a vitória de Dilma em 2010. Meses depois, Lula foi pessoalmente à Venezuela para tratar dos detalhes de seu apoio. Em 2012, João Santana foi quem assinou a campanha do chavista e posteriormente a de Nicolás Maduro, que disputou a presidência após a morte de Hugo Chávez.
Os detalhes da operação desenhada por Lula só se tornaram conhecidos cinco anos depois, como resultado da Operação Lava-Jato – uma das maiores investigações de crimes de corrupção realizadas na história do Brasil. A mulher de João Santana, e também sua sócia, Mônica Moura, assinou um acordo de colaboração com a Justiça brasileira, por meio do qual revelou, entre vários crimes cometidos em uma série de países da América Latina, como foi sua atuação, bem como a do marido, nas eleições presidenciais na Venezuela.
Mônica disse aos procuradores federais brasileiros que ambos foram trabalhar nas campanhas venezuelanas por meio de um arranjo coordenado pelo ex-presidente Lula. Segundo ela, o próprio Lula foi quem fez a intermediação do “contrato” com os chavistas, e ao fim se estabeleceu, com um aperto de mãos apenas, que seriam pagos 35 milhões de dólares para João Santana, integralmente por meio de caixa dois. O acerto foi definido com Nicolás Maduro, que havia sido indicado por Chávez para negociar com os brasileiros. Lula e Maduro definiram que parte da conta apresentada por Santana seria paga por empreiteiras brasileiras com contratos na Venezuela. A Odebrecht pagaria 7 milhões de dólares, enquanto a Andrade Gutierrez teria que contribuir com 4 milhões de dólares.
Para as autoridades brasileiras, Mônica afirmou que Nicolás Maduro repassou-lhe, diretamente, 11 milhões de dólares, em uma série de malas de dinheiro que ela ia buscar pessoalmente na sede da chancelaria venezuelana e, às vezes, no Palácio de Miraflores. Semanalmente, Maduro entregava-lhe malas com valores que variavam de 300 mil a 500 mil dólares. Em um desses encontros, segundo afirma Mônica, foram entregues, de uma só vez, 800 mil dólares. Como havia um grande risco em se transitar com milhares de dólares em cash pelas ruas de Caracas, Maduro oferecia-lhe proteção equivalente à que ele próprio utilizava.
– Sabe o que ele fazia? Ele mandava me buscar com o carro dele, carro blindado, carro preto daquelas caminhonetes de roqueiro americano, de funkeiro americano, sei lá, rapper americano, com mais dois carros, um na frente e outro atrás, me levava para a chancelaria, entrava pela garagem. Os seguranças subiam comigo para a sala dele, eu ficava lá esperando, tomando muito chá de cadeira do Maduro. Eles não têm o menor compromisso com horário. Depois, ele me chamava na sala dele, conversava um pouquinho, conversa fiada de política e depois me entregava o dinheiro. Ele próprio, não mandava ninguém me entregar. Ele entregava. Depois eu descia com o segurança dele, os seguranças, para a mesma garagem. O carro estava me esperando, ele levava até o hotel de volta.
Depois que Maduro e Lula definiram a atuação de João Santana na campanha, os arranjos para a arrecadação do dinheiro junto às empreiteiras brasileiras ficaram sob a responsabilidade do então embaixador da Venezuela no Brasil, Maximilien Arveláiz, e de um dos líderes do Partido dos Trabalhadores, o ex-ministro de Lula, José Dirceu. Mônica Moura afirmou que Arveláiz era o “articulador” da campanha de Chávez, por causa de sua “boa relação” com as construtoras e com a cúpula do PT.
Segundo a empresária Mônica Moura, apenas a Odebrecht – entre todos os que participaram do “consórcio” montado por Chávez e Lula e administrado por Arveláiz – pagou integralmente o combinado. A empresária revelou que, dos 35 milhões previamente combinados, apenas 20 milhões foram efetivamente pagos. A Odebrecht entregou à empresa de João Santana os 7 milhões de dólares previstos. O pagamento foi realizado no exterior por meio de contas e empresas offshore. Dos quatro milhões de dólares prometidos pela Andrade Gutierrez, apenas metade foi entregue. Os 11 milhões de dólares que Nicolás Maduro fez questão de entregar pessoalmente a Mônica Moura tem origem – conforme suspeitam ex-chavistas no exílio – somente em duas possíveis fontes: a corrupção e o narcotráfico.
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