Em mais um brilhante artigo na Gazeta do Povo, Paulo Briguet expôs o que não é segredo para mais ninguém no Brasil ou no Mundo, referindo-se ao indiciamento de Jair Bolsonaro e de mais 36 pessoas pela Stasi(1) alexandrina.
"Esse indiciamento teratológico nada mais é do que a continuidade e a consumação do golpe que as elites políticas deram no povo brasileiro a partir da descondenação de Lula, levando-o da cadeia para a cadeira presidencial."
É preciso, portanto, sempre estar se relembrando que o golpe aplicado no Brasil não foi por acaso. Este sim, foi precedido de planejamento, organização e as decisões sobre as devidas atribuições, cuja execução já teve, pelo menos, três episódios de destaque: a descondenação de Lula, sua eleição para o Planalto e o 8 de janeiro de 2023.
Para ilustrar seu artigo no caso do indiciamento de Filipe Martins, Briguet utiliza um fato que ocorreu em 1936, no auge dos Processos de Moscou — julgamentos farsescos a partir dos quais milhões de vidas foram destruídas na União Soviética —, o ditador Josef Stálin ficou furioso quando descobriram que uma suposta reunião secreta para tramar o assassinato de autoridades comunistas havia ocorrido no Hotel Bristol, na Dinamarca. O único problema, logo notado pelos que acompanhavam os julgamentos, era que o tal hotel havia sido demolido 19 anos antes. Diante da falha de narrativa, Stálin bradou:
— Para que diabos vocês precisam do hotel? Deveriam ter dito estação ferroviária. A estação está sempre lá!
Como se sabe, e usando as palavras do Briguet, "a Stasi do Imperador Calvo agora resolveu mudar a sua versão sobre Filipe Martins. Doravante, ele será acusado de ter “simulado sua viagem aos EUA para se esconder da polícia”.
(1) Stasi: organização de polícia secreta e inteligência da República Democrática Alemã (RDA).
Boa leitura.
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O fantasma de Stálin e o inacreditável caso de Filipe Martins
Por Paulo Briguet 24/11/2024 08:00
“Ou se prende os comunistas pelos crimes que eles cometeram, ou eles, fortalecidos, irão nos prender por crimes que não cometemos.” (Olavo de Carvalho)
Em 1936, no auge dos Processos de Moscou — julgamentos farsescos a partir dos quais milhões de vidas foram destruídas na União Soviética —, o ditador Josef Stálin ficou furioso quando descobriram que uma suposta reunião secreta para tramar o assassinato de autoridades comunistas havia ocorrido no Hotel Bristol, na Dinamarca. O único problema, logo notado pelos que acompanhavam os julgamentos, era que o tal hotel havia sido demolido 19 anos antes. Diante da falha de narrativa, Stálin bradou:
Lembrei-me desse episódio quando vi o nome de Filipe Martins entre os indiciados por “atentado violento ao Estado Democrático de Direito”.
Como todos sabem, o ex-assessor internacional da Presidência esteve preso por seis meses sob acusação de fazer uma viagem internacional que ele não fez e que, se tivesse feito, não seria crime.
Depois de inúmeras provas de que estivera no Brasil todo o tempo, Filipe foi finalmente libertado no último mês de agosto. Libertado, em termos: mesmo não tendo cometido crime algum, ele continua sendo tratado como um bandido perigoso e encontra-se limitado por uma série de restrições absurdas, como a de usar tornozeleira eletrônica, ser impedido de trabalhar e precisar comparecer semanalmente ao Fórum de sua cidade.
Assim como quem diz bom-dia, a Stasi do Imperador Calvo agora resolveu mudar a sua versão sobre Filipe Martins. Doravante, ele será acusado de ter “simulado sua viagem aos EUA para se esconder da polícia”.
Não por acaso, Olavo de Carvalho dizia que os Processos de Moscou representam a forma mentis da esquerda contemporânea.
O problema, no caso de Filipe Martins, é que a estação ferroviária também não existe. O documento I-94 da Customs and Border Protection (agência do Departamento de Segurança Interna dos EUA) informando sobre a suposta de entrada do ex-assessor presidencial em Orlando, no dia 30 de dezembro de 2022, foi emitido com a grafia errada do nome do passageiro (Felipe, em vez de Filipe) e utiliza o número de um passaporte que fora perdido ou roubado em 2021, e cuja perda fora comunicada às autoridades brasileiras pelo próprio Filipe.
Se alguém quisesse levar a sério essa história pessimamente roteirizada, precisaria ignorar o fato de que Filipe Martins realizou, já no dia 31 de dezembro de 2022, um voo comercial para Curitiba e “escondeu-se” na casa dos pais de sua esposa, de onde fez tudo aquilo que um fugitivo da polícia não pode fazer sob pena de ser imediatamente localizado: abriu conta bancária, usou o mesmo celular que usava antes, andou de Uber e pediu iFood.
Ao acusá-lo de “simular” a viagem para os EUA, a Stasi alexandrina acaba por dar um tiro no pé: agora, as autoridades americanas vão querer descobrir quem foi o responsável por forjar esse falso I-94 com o passaporte roubado de Filipe. A pessoa que fez isso, sem nenhuma dúvida, merece ir para o xilindró por muitos anos.
É como disse em seu perfil no X a jornalista americana Mary Anastasia O’Grady, colunista do Wall Street Journal:
“Quem foi o agente da Alfândega e da patrulha de fronteira em Orlando que fez isso acontecer — e com um passaporte perdido ou roubado em 2021, cujo roubo fora registrado pelo próprio Filipe?”
Na mesma linha lógica, o empresário Otávio Fakhoury questionou:
“Como poderia Filipe Martins querer simular sua saída do Brasil para se esconder da PF se no mesmo dia 31 de dezembro ele pegou um voo comercial de Brasília para o Paraná e manteve seu fone o tempo todo ligado e rastreável? Desde quando alguém que deseja sumir do mapa fica aí pegando voos comerciais, andando de Uber e pedindo iFood?”
O caso de Filipe Martins me fez lembrar um conto de Philip K. Dick, depois adaptado para o cinema por Steven Spielberg: Minority Report. Nessa pequena obra-prima, o gênio da ficção científica narra a história de um policial que trabalha no Departamento de Pré-Crimes em uma sociedade do futuro.
Na época em que o policial vivia, os crimes foram totalmente erradicados graças a três seres mutantes — chamados precogs — cujos sonhos preveem a ocorrência de crimes antes que eles sejam consumados. O resultado é que milhares de pessoas estão presas por “pré-crimes” — ou seja, delitos que elas poderiam ter cometido (enfatize-se o uso do verbo no futuro do pretérito). Mas não cometeram.
O espírito de Minority Report baixou na Stasi alexandrina — embora os roteiristas brasileiros não tenham um milésimo do talento de Philip K. Dick. O que se vê no indiciamento de Bolsonaro e mais 36 pessoas é a criminalização do pensamento, da cogitação e da preparação de um golpe que jamais existiu — quando, no ordenamento jurídico brasileiro, essas fases do iter criminis não constituem crime e não podem ser punidas.
Não existe — muito ao contrário do que supõe o governador Tarcísio — a mínima possibilidade de que se realize uma investigação e um julgamento justo com base nesses alicerces podres.
Esse indiciamento teratológico nada mais é do que a continuidade e a consumação do golpe que as elites políticas deram no povo brasileiro a partir da descondenação de Lula, levando-o da cadeia para a cadeira presidencial.
É necessário, para o atual regime, criar uma narrativa para substituir essa realidade.
Para tanto, os donos do poder precisam criminalizar toda a verdadeira oposição — ou, em outras palavras, destruir a direita conservadora. Aqui, como na Rússia de Stálin, qualquer crítica sobre as políticas ou o caráter do regime automaticamente será considerada “terrorismo” e “conspiração para assassinato”.
No entanto, a verdade resistirá a todos esses golpes — e será revelada. Em Minority Report, existe um problema convenientemente ignorado pelas autoridades: os três precogs algumas vezes divergem nas suas previsões de crimes.
No filme de Spielberg, um chefe de polícia corrupto e assassino se aproveita dessas brechas para ocultar os próprios crimes. É exatamente o que o regime PT-STF está fazendo hoje: usando a narrativa do golpe falso para encobrir o golpe real. Outra vez a vida imita a ficção. Mas, no fundo, isso é uma boa notícia — pois, na vida e na arte, a vitória final pertence à Verdade.
Entre os indiciados por “abolição violenta ao Estado Democrático de Direito”, está o Padre José Eduardo de Oliveira, sobre quem já falei numa coluna anterior. Para encerrar esta crônica, nada melhor do que reproduzir o que ele acaba de dizer em suas redes sociais:
“Se você se sente insatisfeito, humilhado, é aí que você dá mais frutos. Aprenda a glorificar a Deus nessa situação, porque é a glória dEle que importa, não a nossa. Nós não podemos buscar a nós mesmos, nós temos que buscar a Deus e esperar com calma os momentos de Deus. Isso é grandioso. Às vezes nós ficamos tão contrariados porque as pessoas fecham a porta na nossa cara, porque talvez nos desprezem ou por algum motivo nos excluem, mas tudo isso está calculado pela providência divina para produzir uma grande eficácia sobrenatural. ‘Não é pela força nem pela violência, mas pelo meu Santo Espírito’, diz o Senhor através do profeta Zacarias”.